Há poucos meses, conversei rapidamente com uma seguidora via Snapchat (meu perfil lá é “macetesdemae” e essa está sendo a minha rede social “queridinha” do momento. Acompanhem!) . Ela me contou que o seu filho tinha uma síndrome, chamada Síndrome de West, e me sugeriu abordar o tema aqui no blog, já que nunca tinha falado sobre ele.
No mesmo momento, eu a convidei para dar o seu relato, contar, de mãe para mãe, pelo que ela, seu filho e seu marido passaram, e explicar um pouco sobre o que se trata essa doença.
Ela, no momento, ficou em dúvida, mas depois, lembrando o quanto o relato de outras mães a ajudou nos momentos de desespero com o problema do seu filho, aceitou o meu convite.
Assim, hoje está aqui o relato da Carla, mãe do Yuri, um menininho portador de Síndrome de West.
Relato de Síndrome de West
Por Carla D.
Confesso que demorei muito reunindo a coragem necessária para escrever essas palavras. Pelo simples fato de que tinha medo. Medo de que, ao escrever sobre o assunto, tudo fosse acontecer novamente e nós fôssemos entrar novamente naquele abismo que parecia não ter fim.
Há um ano, o meu filho, Yuri, começava a apresentar os primeiros sintomas da Síndrome de West. Nessa época, lembro que fiquei louca procurando, em todos os lugares, informações sobre os espasmos e tudo o que estava acontecendo com ele e 90% de tudo o que líamos era desesperador. Por isso, me sinto no dever, depois de tudo o que passamos, de compartilhar nossa história, sobretudo em um veículo de comunicação como este, que é um dos primeiros que as mães acessam quando tem alguma dúvida com relação aos seus filhos.
Yuri tinha 6 meses e meio e nós havíamos retornado de uma viagem ao Chile (sou cantora e tinha ido fazer um trabalho). Viajar com ele foi tranquilo. Estávamos apenas dando papinha de frutas e ele ainda mamava no peito. Assim que chegamos, iniciamos a introdução da papinha salgada. Um dia, eu estava dando comida para ele e notei que ele olhou rapidamente para cima. Parecia que tinha engolido mal ou que não estava gostando do sabor da comida. Imediatamente, chamei meu marido, que também achou estranho. Ficamos observando e notamos que aquilo começou a se repetir. Nos apavoramos e começamos a pesquisar o que poderia ser. Tentei falar com o pediatra que nos atendia na época e que não foi muito atencioso, mas mencionou que talvez fosse melhor levá-lo num neuropediatra. Tentei marcar particular (nosso convênio não tem médico que atenda esta especialidade) e só consegui para o mês seguinte. Resolvemos, então, ir ao Hospital Infantil. Lá, a pediatra que estava nos atendendo já estava quase nos mandando embora quando viu o Yuri ter um espasmo e imediatamente mudou a reação. Nos orientou a filmar aqueles episódios e marcou uma consulta com um neuropediatra para a semana seguinte, além de ter pedido um eletroencefalograma.
Eu e meu marido já estávamos bastante preocupados e suspeitando de Síndrome de West, mas só o eletro poderia confirmar. Passaram-se dois dias e o Yuri piorou. As convulsões, que inicialmente eram apenas uma olhadela para cima, passaram também a ser como contrações do tronco, como se a cabeça caísse sobre o peito. Nos apavoramos e voltamos ao hospital. A mesma médica nos atendeu e encaminhou os vídeos que fizemos para uma neuropediatra que mesmo sem o eletro já receitou um anticonvulsivante.
Ficamos super ansiosos até ter o resultado do eletro, mas para a minha alegria (momentânea, mal sabia eu) apontou que nosso bebê tinha apenas epilepsia focal. Lembro de pegar o laudo, abraçar meu filho e chorar de alívio! Nesse meio tempo, fizemos ainda uma ressonância que não apontou nenhuma anormalidade. Fomos para a consulta com a neuro já bem mais tranquilos e ela fez questão de dizer que o Yuri não tinha Síndrome de West mesmo eu perguntando se não seria o caso de fazer novo eletro. Ela apenas mudou a medicação e disse que teríamos que ter paciência e esperar o remédio fazer efeito. Aqui, acho importante fazer um parêntese: nós somos pais e obviamente, hoje, com a internet, sempre vamos pesquisar quaisquer sintomas que nossos filhos apresentem antes de ir ao médico, até para saber explicar melhor o que eles possam estar sentindo ou então discutir sobre algum tratamento, enfim. Eu e meu marido somos relativamente instruídos, ele sabe ler bastante em inglês e por isso nós pesquisamos muito sobre os tipos de epilepsia infantil. Quando fomos na segunda neuropediatra percebemos que ela não estava disposta a escutar nossos relatos com a atenção necessária(mas notamos um pouco com outros também). Todos os sintomas do Yuri apontavam para Síndrome de West e esta médica foi enfática e quase rude, por assim dizer, ao apontar o laudo do primeiro eletro e dizer com todas as letras “está escrito aqui… o que seu filho tem é epilepsia focal”, mesmo depois de eu comentar que havia lido relatos de pais que afirmavam que o primeiro eletro de seus filhos, portadores da Síndrome, também apontava apenas esse tipo de epilepsia num primeiro momento.
Onde quero chegar? Se a médica tivesse sido mais atenciosa a nossos relatos, ela teria pedido um novo eletro e o tratamento correto poderia ter se iniciado 1 mês e meio antes e, nesses casos, quanto antes se inicia a terapia mais adequada, menos dano a criança pode vir a ter. Ou seja, é uma corrida contra o tempo.
Enfim, saímos desta consulta bem mais aliviados, afinal a médica nos garantiu que o Yuri não tinha a maldita síndrome. Iniciamos a nova medicação e continuamos esperando. E o Yuri, piorando. Já não sabíamos mais o que pensar. Havia dias em que ele não tinha tantas crises e nos animávamos mais, mas no dia seguinte lá havia uma piora. Até que chegou, finalmente, a consulta com o neuropediatra particular. Ao examinar o Yuri já percebi pela cara do médico que não teríamos uma boa notícia. No consultório mesmo ele repetiu o eletro e ali estava: hipsarritmia, que comprovava a Síndrome de West. Meu mundo caiu, mas acho que para meu marido foi pior. De certa forma, eu sabia que era isso que o Yuri tinha, mas meu marido tinha nutrido esperanças com o parecer da neuro anterior e para ele foi pior. Iniciamos o tratamento com Sabril no mesmo dia.
Mas você, que está lendo este texto agora, deve estar se perguntando: mas, afinal, o que é Síndrome de West? A Síndrome de West é um tipo de epilepsia infantil que se caracteriza pela tríade espasmos, hipsarritmia e atraso no desenvolvimento neuropsicomotor. Ela pode vir associada a outras doenças, como esclerose tuberosa, por exemplo, ou, então, não ter causa identificada. Nesses casos, é chamada de idiopática, e esse é o caso do Yuri. Ela se manifesta, geralmente, nos primeiros meses de vida da criança e pode gerar sério comprometimento no desenvolvimento. Aos 6 meses e meio o Yuri já estava quase sentando, era um bebê muito risonho e alegre, sempre muito atento. Aos poucos foi ficando mais molinho, olhar perdido e o sorriso foi embora. Passava o dia resmungando e só parecia ficar melhor no colo.
Como mencionei acima, iniciamos o Sabril (vigabatrina) que é a droga mais indicada nesses casos, contudo não estava funcionando para meu filho. As crises e o número de espasmos só aumentavam e ele chegava a ter em torno de 6 crises por dia com mais de 120 espasmos cada uma! Foi nesse momento, como um ato de desespero, que resolvemos fazer uma consulta com uma médica em Curitiba a qual havíamos tomado conhecimento de que utilizava outro tratamento nesses casos, com um hormônio chamado ACTH. Nosso médico, aqui em Florianópolis, intermediou a consulta para que conseguíssemos um horário em seguida e, na semana seguinte, já estávamos lá. A partir daí, foi tudo muito rápido. Na consulta, a doutora ficou otimista com o caso do Yuri e já autorizou que encomendássemos as ampolas do remédio. Fizemos as aplicações em casa, mediante um cuidado rigoroso de assepsia. Só uma pessoa podia ficar dentro de casa com o Yuri (inicialmente eu e na segunda semana meu marido) e não podíamos sair. Tudo o que entrava de compras ou outros itens tínhamos que esterilizar. Foram 14 aplicações e tínhamos que medir a pressão dele todos os dias pois esse remédio pode causar aumento de pressão dentre outros efeitos colaterais.
Foram duas semanas de muito stress. Yuri ficou extremamente irritado. Tinha muita sede e fome e dormia muito mal. Mas valeu muito a pena. No oitavo dia de tratamento ele já não teve mais crises. No eletro que fizemos no sétimo dia já não havia mais hipsarritmia. Quando acabamos o tratamento, dois dias depois, ele deu o primeiro sorriso e nosso mundo voltou a ficar iluminado de novo.
De lá para cá, só temos tido alegrias: ele já teve alta da fisioterapia, a parte motora está 100% e agora temos que correr atrás da parte cognitiva, onde está o maior atraso. Ele está com 1 ano e 7 meses mas ainda não aponta, não fala e tem dificuldades para comunicar o que quer (ou nós temos dificuldade em entender). Está fazendo fonoterapia e terapia ocupacional e a cada dia tem apresentado evolução. Já estamos quase no fim da retirada do Sabril e, em breve, iniciaremos a retirada do anticonvulsivo. Mal posso esperar para vê-lo sem nenhuma medicação. Sabemos que ele pode vir a ter alguma sequela e que há o risco de desenvolver outro tipo de epilepsia ou autismo, mas por tudo que passamos nos consideramos vitoriosos com o quadro atual dele. Eu, particularmente, convivo com o medo de algum dano maior ou uma recaída, mas é algo pessoal e que devo trabalhar até para que não influencie no desenvolvimento dele. Não é fácil…
Após esse longo relato a mensagem final que deixo aos pais é: primeiro, não percam as esperanças, jamais. Segundo, sempre procurem mais de uma opinião e informem-se sobre tudo e terceiro, fiquem atentos… ao menor sintoma é melhor procurar uma opinião medica. Quanto antes melhor! Espero ter ajudado a alguém e agradeço a todos que nos ajudaram e nos ajudam, especialmente as mães que compartilharam suas histórias de sucesso na internet ou comigo. A elas, serei eternamente grata pelo ânimo que me deram quando eu achava que estava tudo perdido!