Coluna Psicologia Infantil – escrita pela psicóloga Raquel Suertegaray
É inerente à condição humana um impulso que chamamos epistemológico, ou seja, do desejo de saber, de descobrir. A humanidade, de certa forma, evolui às custas da curiosidade que, nas crianças, por sua condição de desconhecimento, costuma sempre estar em evidencia, especialmente nas crianças saudáveis.
Tenha em mente que é esperado e é um bom sinal seu filho fazer questionamentos sobre tudo, inclusive querer saber o por quê, do por quê, de por quê. Isto mostra que ele está atento ao mundo e se coloca frente a este de forma crítica e interessada. As crianças tem um repertório ainda pequeno, por isto precisam de tantas explicações e este fato também não lhes permite, muitas vezes, discernir o melhor momento de trazer seus questionamentos à baila e, por este motivo, nos colocam muitas vezes em situações inusitadas e até desconfortáveis.
Não se recrimine por não saber responder ou por não conseguir lidar com a situação. Quando especialistas afirmam que é importante sanar as dúvidas dos filhos, não significa que as coisas tenham que acontecer sempre de modo imediato. Você pode dizer a seu filho que irá responder mais tarde, seja por não saber a melhor forma de responder, por não saber a resposta ou por não ser aquele o momento adequado. Todas estas hipóteses aliás, são fatos que seu filho deverá aprender.
Afinal, os pais não são detentores de um saber infinito que a tudo responde e as crianças perceberem que eles não sabem algo não os torna menos importantes. Assim, você deve sim valorizar a atitude do questionamento e ser sempre honesto, falando que não sabe quando esse for o caso e que irá pesquisar e responder mais tarde (ou até convidá-lo para pesquisar junto).
Desta forma, você ensina ao seu filho que, quando ele não souber algo, poderá ter uma postura ativa e pesquisar por conta própria, tão logo possua recursos e autonomia para isto e que não precisa se envergonhar do desconhecimento.
Ainda, é importante, desde cedo, as crianças aprenderem que para tudo existe um momento certo e que não se pode falar qualquer coisa em qualquer lugar. Portanto, não se coloque em situações constrangedoras. Se a pergunta vier em lugar ou hora impróprios, explique ao seu filho que vocês conversarão sobre o assunto mais tarde, em um momento mais adequado. E, nesses casos, lembre-se: ele tem direito de não saber distinguir um momento do outro (o que é adequado e o que não é), porém, você tem o dever de mostrar isso a ele, explicando que determinados assuntos devem ser tratados em casa, em ambiente privado e não público. Assim, com o tempo, ele passará a distinguir o privado do público, uma capacidade louvável nos dias de hoje (mas, importante: não esqueça de retomar o assunto depois. Isso é sua responsabilidade).
Outro ponto que não pode deixar de ser esquecido é a importância de avaliar qual a maturidade da criança para lidar com as respostas que suas perguntas receberão. Crianças pequenas costumam necessitar de respostas bastante superficiais, pois suas dúvidas também são superficiais, afinal, seu pensamento ainda é concreto e não alcança grandes níveis de abstração.
A regra de ouro é: antes que mais nada, entenda o que de fato a criança quer saber. Isto geralmente é simples de descobrir com uma ou duas perguntinhas. Uma dica é, após uma pergunta mais “complicada” questionar de volta: “onde você ouviu falar sobre isso?” ou “não entendi o que você quer saber, pode me explicar melhor?”. Ao responder essas perguntas seu filho provavelmente deixará mais claro sobre o que exatamente ele está querendo saber.
E lembre-se sempre de responder tudo de forma simples, com termos que fazem parte do vocabulário da criança, sem aprofundar-se demais no tema pois, se a criança quiser saber mais a respeito fará novas perguntas. Também nunca minta. Crianças tem boa memória e você será descoberto em breve. Além disso, não há razões para perder a confiança e a chance de ser quem apresenta o mundo a seu filho, não é mesmo?
As maiores saias justas e dificuldades costumam dizer respeito a temas que envolvem tabus, como morte e sexo. O primeiro pela dificuldade que temos em lidar com a finitude e o segundo pelos preconceitos e pela falsa ideia de que sexualidade é algo ausente no universo infantil.
Tabus ou não, são temas que fazem parte da vida e por isso despertam curiosidade nas crianças. Justamente por serem da vida, não podemos fugir deles, nem precisamos nos apavorar.
Sexo pode ser traduzido simplesmente como o ato de namorar, deixando claro que é algo que acontece entre adultos, sejam eles homens ou mulheres. Já quando o assunto for morte, vale à pena explicar que é o fim da vida e que é algo a que todos nós estamos sujeitos e que, a partir desse momento, significa que as pessoas passam a existir apenas dentro de nós. Ou seja, nesses e em outros assuntos mais complexos, não precisamos transmitir tratados científicos, apenas esclarecer o óbvio.
A medida que eles crescem, as dúvidas podem se tornar mais profundas, porém eles também estarão mais maduros para lidar com as respostas.
Procure não transmitir com sua informação preconceitos. Permita que seu filho forme os seus próprios conceitos e os altere conforme suas experiências. Ensine-o apenas a respeitar as diferenças e a valorizar as pessoas acima de qualquer coisa, mesmo que você não concorde com elas. Ter filhos é também mostrar-se a aberto para as mudanças do mundo, o mundo que vivemos não é o mesmo que nossos filhos irão viver e eles precisam saber que estamos abertos às transformações.
Enfim, perguntas não existem sem respostas e nossa função enquanto pais é oferecer resposta e ensinar nossos filhos a buscar por elas. A infância e as dúvidas de nossos filhos pode trazer de volta às nossas vidas o encantamento de fenômenos e detalhes que nossos sentidos, calejados pela vida, deixaram de perceber e que agora, redescobertos, podem tornar o mundo um lugar muito mais rico em experiências e interessante para viver.