Há alguns dias, recebi esse texto da assessoria de comunicação do Dr. Moisés Chencinski, pediatra e homeopata, e achei que seria de grande utilidade compartilhá-lo aqui no blog. O Dr. Moisés, nesse texto, faz uma reflexão acerca da educação dos nossos filhos e nos convida a um questionamento: será que nossos filhos são mesmo “bem educados”? O que é, exatamente, ser “bem educado”? Venha ver que interessante as observações que ele faz sobre esse assunto. Apesar de longo, definitivamente é um texto que vale a pena ser lido por pais que se preocupam com a educação de seus filhos.
>>>> Leia também esse outro texto do Dr. Moisés publicado aqui no MdM:
Mais um benefício da amamentação que você não sabia.
Seu filho é mesmo bem educado?
Por Dr. Moisés Chencinski, médico pediatra e homeopata
Como dizia Caetano Veloso (Dom de Iludir), “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Cada um de nós sabe o que acontece em nossas vidas e não cabe a ninguém julgar as nossas atitudes. É essa a intenção desse texto. SEM JULGAMENTOS, TÁ?
Esse é um convite à reflexão. E, como sempre, talvez não haja apenas uma resposta certa. Ou talvez não haja respostas. Mas precisamos começar a pensar.
Queremos um mundo melhor para nossos filhos. Então precisamos ter um mundo melhor através de nossos filhos.
Muitos pais se sentem perdidos, confusos, ansiosos, inseguros quando falamos de EDUCAÇÃO, independente da idade da criança e da situação a que ela esteja sendo submetida.
O que é uma boa educação? Como se mede isso? E será que a “boa educação” é a mesma em todos os países, em todas as idades?
DÚVIDA.
O que é uma criança de 2 ou 3 anos bem educada? Será aquela que diz bom dia, boa tarde, boa noite, desculpas, por favor, com licença? Não seria essa uma criança bem “treinada”, bem “condicionada”? Será que essa criança sabe mesmooooo o que ela está falando com um ou dois anos de idade? Ou com três?
Será que uma criança de 2 anos quando pede desculpas, sabe o que isso quer dizer? Ela sabe de verdade o que está fazendo? Com que idade começa essa consciência?
Essa é uma das definições encontradas em um dicionário da língua portuguesa (Houaiss).
“Arrependimento de quem julga ter ofendido, contrariado ou aborrecido outrem“.
Ou seja, uma criança de 2 anos e meio fez alguma coisa que ela depois descobriu (ou, mais provavelmente, alguém disse a ela) que estava errada, se arrependeu e pediu, do fundo do coração, para ser desculpada. E entendeu quando foi desculpada pelo que havia (ou pelo que disseram que ela havia) feito de errado. Seria isso possível?
Algumas posturas que vejo no do dia-a-dia, vindas desde profissionais (pediatras, psicólogos, educadores, escritores) até de pais, me preocupam.
Essas são algumas delas.
– Deixar uma criança chorar horas a fio (que fosse uma hora), durante dias seguidos, para que ela aprenda a dormir sozinha…
O que será que uma criança que chora 5 ou 7 noites seguidas, por 2 a 3 horas aprende? A dormir? Mesmo? Sim, ela dorme. Qualquer um dos inúmeros métodos, se seguido à risca, faz a criança dormir. Mas a que custo? Isso é educar?
Qual a impressão que fica em uma criança que pede ajuda, através de uma das únicas formas que sabe (choro), e dia após dia, tem seu pedido ignorado?
Até os 3 a 4 meses, um lactente dorme mamando, sempre que possível, no seio da mãe. E ele não tem, até essa idade, um ritmo de sono (come de dia e acorda à noite) mediado pela mudança luz / escuro, pela liberação de melatonina (ritmo circadiano). O primeiro trimestre de vida do bebê pode corresponder a uma fase conhecida como exterogestação. A transição de “vida no útero” para “vida real” não é tão simples quanto o corte do cordão umbilical. Todos os bebês humanos nascem prematuros, quando comparados aos bebês de outros mamíferos (não enxergam, não sentam, não ficam em pé, não falam, não têm um ritmo de sono).
Eles precisam dessa transição cuidadosa para que, com segurança, no momento adequado, possam se desenvolver (ato de “desenrolar, permitir a saída ou aparecimento de algo que estava tolhido”).
– Bater em uma criança imaginando que assim ela vai aprender a se comportar melhor…
Gente, isso não é legal (nem bacana e nem dentro da lei) – Lei Menino Bernardo (LEI Nº 13.010, DE 26 DE JUNHO DE 2014).
Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se:
I – castigo físico: ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança ou o adolescente que resulte em:
- a) sofrimento físico; ou
- b) lesão;
II – tratamento cruel ou degradante: conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que:
- a) humilhe; ou
- b) ameace gravemente; ou
- c) ridicularize.”
“Art. 18-B. Os pais, os integrantes da família ampliada, os responsáveis, os agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou qualquer pessoa encarregada de cuidar de crianças e de adolescentes, tratá-los, educá-los ou protegê-los que utilizarem castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto estarão sujeitos, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, às seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo com a gravidade do caso:
I – encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;
II – encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;
III – encaminhamento a cursos ou programas de orientação;
IV – obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado;
V – advertência.
Sem mais comentários.
– Cantinho do pensamento com duração de um minuto por ano de idade.
Essa é a mais estranha.
1º) Alguém já viu a cena de uma criança de um ano, sentada, pensando no que fez, em um canto, por UM MINUTO INTEIRINHOOOOOOO??? Castigo pra quem? Só se for para os pais que têm que ficar ao lado dessa criança o tempo todo, senão ela para de pensar e se levanta ou adormece e cai;
2º) Se essa criança de 1, 2 ou 3 anos ficasse mesmo sentadinha pelo período determinado, pelas regras, será que ela iria pensar, em algum momento, sobre o que ela está fazendo lá? Mesmo?
3º) Quem conhece UM CASO SÓ de uma criança que fez algo que os adultos julgaram que era inadequado, que ficou no canto do pensamento ou do castigo e definitivamente, de verdade, nunca mais fez nada de errado pensando: “Melhor eu não fazer isso senão vou ter que ficar X minutos sentado de castigo!!!”
Crianças precisam tanto de pessoas que OLHEM POR ELAS, quanto das que OLHEM PARA ELAS e COM ELAS.
EDUCAR.
Qual é a sua ideia de educação? Será que dá para definir em uma só dessas explicações do dicionário? Ou em todas? Ou em nenhuma?
- Dar ou oferecer (a alguém) conhecimentos e atenção especial para que possa desenvolver suas capacidades intelectuais, morais e físicas.
- Transmitir conhecimento a; ensinar, instruir.
- Fazer (alguém) adquirir certos costumes e princípios exigidos por uma sociedade civilizada.
- Treinar um animal a obedecer; adestrar, domesticar.
- Adaptar um ser vivo às condições atmosféricas ou climáticas ou a um ambiente.
- Buscar atingir um alto nível de evolução espiritual.
Educar é tudo isso, é muito mais do que isso e talvez não seja nada disso. Estamos querendo educar as crianças como se elas fossem adultas, como se elas tivessem as nossas ferramentas para interagir com o mundo.
Os valores podem até sofrer uma influência do que é dito e repetido. E tudo precisa sim ser dito e repetido, à exaustão e até um pouco mais. Porém, com certeza, nossas ações podem definir, com muito mais impacto, os valores que queremos transmitir a uma criança.
Nada contra os bons dias, os boas noites, os por favores, as desculpas ou os obrigados. Eles são consequências da vivência e convivência e, uma vez incorporados de forma integral, serão naturalmente incluídos no dia-a-dia das crianças, adolescentes e adultos.
Mas que tal pensar em EDUCAR como sendo sinônimo de transmissão de valores maiores? RESPEITO, HUMILDADE, HONESTIDADE, AMIZADE, CIDADANIA, VÍNCULO, PERSEVERANÇA, AMOR pelo próximo, pela natureza, pelo mundo?
Vamos… refletir?
Dr. Moises Chencinski (CRM-SP: 36.3490), pediatra e homeopata, membro do Departamento de Pediatria Ambulatorial da Sociedade de Pediatria de São Paulo.